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quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Confúcio: plantando harmonia e virtude em meio à discórdia



Confúcio foi um pensador e filósofo chinês que viveu entre 551-479 a.C cujo nome é sinônimo da Filosofia Oriental (chinesa, coreana e japonesa). De origem modesta, Confúcio nasceu numa família humilde. Seu pai faleceu quando ele tinha apenas três anos. Assim, crescendo em relativa pobreza, teve uma série de empregos (pastor de rebanhos, escriba, guarda-livros), por isso, a humildade foi e continua sendo uma virtude central das culturas confucianas.  


Apesar da origem humilde, Confúcio alcançou uma posição de poder em sua vida adulta que o possibilitou a persuadir vários governantes que governar pela virtude era superior a governar pela coerção. Ele dedicou as últimas décadas da sua vida ao magistério, e, por isso, ele estabeleceu um enorme legado que viria a definir o caráter filosófico da cultura Oriental, de modo que, sua influência no Oriente chega a superar a influência de Aristóteles no Ocidente, pois, seu projeto tratava-se da compreensão das leis e sua aplicação na via cotidiana.

Na doutrina de Confúcio não há um Deus, uma unidade criadora e muito menos templos ou igrejas. Seu objetivo era a busca da harmonia da vida e do mundo. Ele falava de ‘meu Tao’ e aconselhava os seus discípulos a dedicarem inteiramente ao Tao, pois, segundo ele, se um homem escutasse o Tao de manhã e morresse à noite, ele não teria vivido em vão. O Tao é a harmonia predominante no universo, ou seja, o relacionamento equilibrado entre todas as coisas que deve servir de modelo para a sociedade.

Ele acreditava que a natureza e o universo estão sempre em harmonia, e que isso deve se aplicar também ao homem. Portanto, os homens devem viver em compreensão e harmonia. Para esse fim, o homem precisa de conhecimento e compreensão que podem ser obtidas pelo conhecimento da tradição, pois, para ele, o homem era naturalmente bom e que todo mal brota da falta de conhecimento. Por isso, a educação implica transmitir conhecimentos corretos.

Na sua formação foram importantes quatro obras acessíveis a ele na altura: O livro das mutações (aprendeu a seguir o caminho do ‘Tao’); O livro das odes (aprendeu a reverenciar o amor em suas manifestações poéticas e humanistas); O livro da história (aprendeu a venerar a ancestralidade); O livro da música (aprendeu a sintonizar com as vibrações que sustentam o universo). Mas, foi o ‘Tao’ conforme revelado à ele no livro das mutações, que permeou seu pensamento e deu forma ao seu sistema de ética e virtude.

Confúcio encorajava o comprometimento com a aprendizagem por toda a vida. Sua mensagem é que nascemos para aprender, em vez de permanecer em estado de ignorância. Mas, segundo ele, a busca do saber pelo saber, pode fechar a mente e não conseguir abrir o coração. Então, sabendo pouco ou muito, o mais importante é o que cada um faz com o que sabe na prática da virtude, pois, alguns praticam a virtude através do aprendizado, e outros, além.

Ele acreditava que a compreensão humana desenvolve-se através da interação entre teoria e prática, por isso, precisamos de teorias sólidas para formar nossas atividades práticas, para progredirmos como seres humanos. Por isso, a manutenção da ordem equilibrada depende da harmonia entre as teorias das circunstâncias mutáveis e da prática das virtudes imutáveis.



MARINOFF, Lou. O caminho do meio. Trad. de Paulo Andrade Lemos e Márcia Sobreiro. - São Paulo: Editora Record, 2008. 

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

BUDA: O CAMINHO DO MEIO



Siddhartha Gautama (566 a. C.- 486 a. C.), ou Buda “o desperto”, foi ele próprio um tipo de extremista em períodos diferentes de sua vida e descobriu que os extremos não nos ajudam a tornar-se despertos. Aos 40 anos, depois de anos de autoindulgência seguido por um árduo ascetismo religioso, ele tornou-se totalmente iluminado enquanto estava sentado em baixo de uma árvore bodhi.

Buda afirmou que os extremos não conduzem, em si a iluminação. Esses extremos são ilustrados na infelicidade que vemos no ocidente materialista e entre praticantes de religiões fanatizadas e o hedonismo americano que produz demais e consome demais. Cada um desses extremos acusa o outro de diabólico.

O Caminho do Meio de Buda nos ajuda a evitar esses extremos pela prática da moderação em nossas próprias vidas e da compaixão pelo sofrimento alheio. Ele nos ensina a não usar nossas diferenças como base de apegos negativos, como o ódio.

Qual é o Caminho do Meio de Buda? O caminho do meio é a reverência pela santidade da vida: a vida de cada um, a vida das outras pessoas, a vida da natureza e todas as inter-relações extensivas e intrincadas. Entretanto, para a consistência harmoniosa com os outros, precisamos “coexistir” harmoniosamente conosco.

Por isso, Buda pensa nas Quatro Nobres Verdades, que constituem na teoria e na prática de tal coexistência harmoniosa, pois, sua filosofia é racional, empírica, ou seja, científica. Então cada um pode testá-la.  

A Primeira Nobre Verdade é que a vida engendra o sofrimento, ou seja, todos sofrem: cristãos, muçulmanos, ateus, agnósticos, etc. o sofrimento é uma verdade inegável da existência humana...

A Segunda Nobre Verdade diz que o sofrimento tem suas causas, ou seja, todos os fenômenos estão sujeitos às leis de causa e efeito. Os ciclos de sofrimento humano, a luta, a dor, o desgosto, a lamentação, o desespero, o arrependimento, a doença e a morte – cada um tem sua causa...

A Terceira Nobre Verdade diz que a causa do sofrimento podem ser eliminadas, pois, o sofrimento humano desaparece quando suas causas são eliminadas, abrindo caminho para a harmonia, da tristeza para a felicidade, do desgosto para a alegria, da lamentação para a celebração, do desespero para a esperança, do arrependimento para a realização. Tudo é fugaz e temporário...   

A Quarta Nobre Verdade indica o caminho para libertar-se do sofrimento. Buda aponta um conjunto de práticas explícitas para a realização desta tarefa através do caminho óctuplo, pois, existem oito etapas de prática para a diminuição do sofrimento, ou seja: 
A compreensão correta (entender o sofrimento), o pensamento correto (ter boa vontade inofensiva), a palavras correta (entender o poder das palavras), a ação correta (fazer as coisas com moderação), o modo de vida correto (ganhar a vida de maneira prestativa), o esforço correto (encarar desafio de maneira construtiva), atenção correta (presença da mente, consciência das emoções) e a concentração correta (desenvolver poderes mentais da atenção, visualização, da compressão, da compaixão que levam a serenidade e tranquilidade).    
Isto é em parte, o que explica o fato de o Budismo ser mais do que uma religião, pois, qualquer outra religião depende do poder externo para a salvação  ou para a redenção. O Budismo não depende de poderes externos, pois, em vez disso, mobiliza recursos que estão dentro de cada um. O caminho do Meio mora dentro de cada um, e o Budismo desperta para ele.




Referência: 

MARINOFF, Lou. O caminho do meio. Tradução de Paulo Andrade Lemos e Márcia Sobreiro. – Rio de janeiro: Record, 2008, p. 97 a 104.

segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Afinal, quem era Jesus Cristo?


Quem era Jesus Cristo? Homem? Deus? Homem e Deus? E como relacionavam-se nele essas duas "naturezas", divina e humana? Onde termina uma e começa outra? 

Quando Jesus chora no Getsêmani (jardim das oliveiras) ou se desespera na cruz, é o homem ou Deus que agoniza? Como pode Deus agonizar? 

A opção final dos primeiros cristãos será pela natureza dupla e não misturada de Cristo, Deus e homem. Quando chora e agoniza na cruz, é o homem que fala. Quando ressuscita, é Deus quem vence a morte humana. Por outro lado, a dupla natureza de Cristo será importante para entendermos o peso da sua paixão: um Deus que sente dor por amor (ágape) à humanidade, esvaziando-se de seus "superpoderes" para sofrer a paixão em nome da pedagogia do amor, pedindo ao Pai (na condição de homem) que "perdoe porque eles não sabem o que fazem" e nos "redimindo" dos nossos pecados. A escolha pela dupla natureza não deve ser menosprezada porque ela carrega em si um sentido teológico essencial. 

Se Jesus fosse apenas um homem, mais um profeta de Israel ou um "mero" messias, como diziam os arianos, ele não teria poder para interromper sua paixão, e, portanto, seu amor pela humanidade poderia ser "diminuído", uma vez que fosse visto como fruto, em parte, de sua impossibilidade de mudar seu destino, isto é, de não sofrer a paixão injusta, uma espécie de sublimação melosa de seu fracasso. Jesus sofreria por não poder evitar sua própria agonia e, portanto, sua morte não poderia ser evitada, e seu amor seria então o amor de um justo, mas, fraco como todos nós. Seu amor não teria o impacto cosmológico-moral de alterar a economia do pecado. Há uma fina psicologia de Cristo em jogo aqui. 

Se por outro lado, ele fosse apenas espírito, sua paixão seria apenas uma farsa para emocionar o povo. Sua dor seria uma mentira. Sendo ele apenas um homem, seu amor seria "menor", sendo ele apenas um espírito divino, sem corpo, seu amor seria sem agonia verdadeira. Apenas a dupla natureza daria a Jesus sua grandeza teológica: um Deus que sofre livremente, por amor à humanidade. 

Todavia, a crítica histórica pontuará que a divinização de Jesus será feita à custa de um caráter popular original. Até na arte da época podem-se ver os sinais desse processo de divinização como roubo  do Cristo do povo e recriação da figura de Jesus na pele de um Deus que, na realidade, se faz parente do imperador bizantino: no teto da Basílica de Santa Sofia, em Istambul, hoje chamada de Aya Sofia pelos turcos, vemos o Deus Cristo "de mãos dadas" com o imperador, enquanto o povo fica de fora. 

Mais uma vez, política e teologia se confundem. Se é verdade que o Cristo pobre foi substituído com sua divinização, pelo Cristo da aristocracia bizantina, nem por isso, a teoria da dupla natureza de Cristo é menos importante para o drama que associa um Deus à paixão na cruz. Os desdobramentos contemporâneos dessa questão são muitos [...]. 


PONDÉ, Luíz Felipe. Para entender o cristianismo hoje. - São Paulo: Benvirá, 2011, p. 31, 32, 33.