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quinta-feira, 10 de maio de 2018

Meu Pároco é gay: o que faço?




Por: Vanildo Luis Zugno[1]

Nada. Não faça nada! Se você fizer qualquer coisa, é muito provável que faça bobagem. Ou que o que você venha a fazer seja considerado por outras pessoas como uma grande bobagem. O risco é grande. Então o melhor é não fazer nada!

E há várias razões para não fazer nada. A primeira e fundamental, é que ser gay é normal. Já passou o tempo em que se considerava que homossexualidade era doença. A medicina, a psicologia e os estudos antropológicos coincidem em afirmar que a homossexualidade é uma das formas de o ser humano viver a sua identidade de gênero e a sua vida sexual. Em todos os tempos e lugares, sempre houve uma parcela da população – masculina e feminina – que viveu e expressou sua condição homossexual. O modo como as diferentes culturas aceitaram esse grupo social é que variou e varia nos tempos e lugares. Enquanto em algumas culturas a homoafetividade e a homossexualidade eram reprimidas e consideradas uma maldição, em outras, foram vistas como uma bênção dos deuses para a comunidade. Hoje, em pleno século XXI, só os fundamentalistas religiosos e as tendências políticas conservadoras e autoritárias ainda consideram a homossexualidade um pecado, doença ou ameaça para a sociedade. Então, se seu pároco é gay e você se considera uma pessoa normal, civilizada, culta, vacinado e imunizado contra os totalitarismos religiosos e políticos, fique calmo! Ele é uma pessoa normal e não há necessidade de você se preocupar com a sexualidade do padre.

Em segundo lugar, uma boa razão para você não fazer nada, é que o bispo já sabe que o padre é gay. Não precisa contar prá ele e nem pros outros padres. Se você se deu conta que o padre é gay, é praticamente certo que os colegas dele, os outros padres, assim como o bispo dele, também saibam que ele o é. E mais: é quase certo – eu diria, quase impossível que não! – que o bispo sabia, antes mesmo de ordená-lo, que ele era gay. Afinal, para ser padre é preciso passar por pelo menos oito anos de formação nos seminários. E, em oito anos, é impossível não conhecer uma pessoa e saber que ela é gay. Só não vê quem não quer... Se os formadores e o bispo não quiseram ver, aí o problema já não é o padre e sua homossexualidade. O problema é a incapacidade ou falta de vontade de considerar a afetividade e a sexualidade como fator importante na formação de um padre. E se eles sabiam e mesmo assim o ordenaram, é porque acreditavam na possibilidade e capacidade de uma pessoa gay ser padre e pároco. Aí o problema é você e sua intolerância a um fato aceito pela hierarquia da Igreja.

Mas você poderá dizer: “o problema é que o padre tem um namorado”! Fique tranqüilo: padres heteroafetivos e heterossexuais também têm namoradas. E alguns até tem filhos e filhas. E a maioria – se não todos – os padres e bispos sabem disso e tentam administrar estas situações. Alguns o fazem com mais e outros o fazem com menos habilidade dando lugar a escândalos que são exacerbados pela mídia em busca de audiência. Outros, a maioria, passam imperceptíveis e a vida nas paróquiais continua normal como se nada tivesse acontecido. No máximo, no final do ano, o padre é transferido para outra paróquia. Então, se é possível administrar as namoradas dos padres héteros, por que não administrar os namorados dos padres homos?

E, convenhamos, se nos despirmos de preconceitos e olharmos friamente, há muitos padres que convivem informalmente com uma mulher ou com um homem que são muito melhores párocos e pastores do que aqueles que seguem rigidamente as normas do celibato. E os paroquianos,  também se pode constatar empiricamente, aceitam com muita tranqüilidade um padre em sua situação canonicamente irregular quanto ao celibato, desde que ele seja alguém que atende com carinho, préstimo e atenção os fieis que lhe foram confiados. Como ouvi recentemente numa Paróquia em que fui convidado para uma palestra: “Todo mundo sabe que o padre vive com a... Mas ele é um bom padre. Ele atende todas as pessoas com muito carinho e está sempre disponível para a comunidade. Prá nós está bem assim. A gente gosta dele e ninguém se importa de ele viver com a mulher dele.”

Voltando ao caso do pároco gay, eu diria que, se você considera que a homossexualidade não é doença e você está ciente de que o bispo sabe que seu pároco é homossexual, você não tem nenhuma razão em se preocupar com isso e se perguntar o que fazer. Retifico. Se esse for o caso, acho, sim, que você deve ter uma preocupação. Mas é bem outra... Sinceramente, acho que você deve perguntar-se por que o fato de o padre ser homossexual o incomoda tanto. Será que é o jeito dele viver a sexualidade diferentemente daquilo que é considerado padrão pela sociedade que incomoda você? É a diferença dele que lhe perturba? Ou talvez você se perturbe por existir a hipótese de que você gostaria de ser como ele e não tem coragem?

Em qualquer uma destas hipóteses, o problema já não é o padre que é gay. O problema e outro: é a dificuldade que temos, nos ambientes cristãos e católicos, em falar sobre afetividade e sexualidade. E não só dos padres, mas de toda a comunidade cristão. E isso, sim, é um problema grave pois a salvação não passa só pela alma. Ela também perpassa nosso corpo, nossos sentimentos e nossas relações.

FONTE: 






[1] Frei capuchinho. Graduado em Filosofia (UCPEL – Pelotas) e Teologia (ESTEF – Porto Alegre), mestre em Teologia (Université Catholique de Lyon – França), é professor de Teologia na ESTEF e no UNILASALLE (Canoas) e doutorando em Teologia na EST (São Leopoldo).


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